Como o cooperativismo de plataforma pauta novos modelos de negócios

Dentre os sete princípios do cooperativismo estão a gestão democrática, a participação econômica, o interesse pela comunidade, a autonomia e a independência. Tais princípios remetem ao estatuto da cooperativa de consumo de Rochdale, de 1844. Evidentemente, de lá para cá muita coisa mudou, inclusive a tecnologia disponível, que viabilizou, por exemplo, o conceito de cooperativas de plataforma.

O termo cooperativas de plataforma foi cunhado pelo professor e ativista Trebor Scholz, da The New School, nos Estados Unidos, em 2014. De acordo com ele, o cooperativismo de plataforma é um modelo de negócios que prioriza os aspectos democráticos. Mais do que isso, baseado nos conceitos de economia do compartilhamento.

Assim, tem como base a copropriedade e a gestão compartilhada por meio de serviços digitais. Ou seja, nada mais do que a essência do cooperativismo potencializada pelas possibilidades criadas pela tecnologia.

Cases de cooperativas de plataforma

Para entender melhor, imagine que o Uber não fosse propriedade de uma única empresa, mas dos motoristas. E estes tomariam as decisões estratégicas e, claro, dividiriam igualmente os lucros obtidos com a operação.

Isto é cooperativismo de plataforma. E uma iniciativa semelhante nasceu em Maringá, no Paraná. O VouBem é um app criado pela CooperDinâmica motivada pela insatisfação dos motoristas com as taxas cobradas pela Uber.

Assim, a principal proposta do VouBem são as tarifas mais baixas tanto para motoristas quanto para passageiros.

Outro exemplo, este irlandês, é a plataforma de música Resonate. Mais uma vez em contraponto a plataformas mundialmente difundidas, como o Spotify, o Resonate tem como proposta tornar a distribuição de música mais justa para os artistas.

Na prática, é uma plataforma coletiva em que os donos são os usuários – músicos e ouvintes – e a remuneração aos artistas é superior à praticada pelas tecnologias tradicionais.

Cooperativismo de plataforma como inspiração

Os conceitos das cooperativas de plataforma foram aplicados na criação da CleanClic, plataforma colaborativa para geração e consumo de eletricidade. A CleanClic, do empreendedor Vitor Romero, conecta e promove a gestão de unidades consumidoras para proporcionar menor custo a pessoas físicas e jurídicas.

A energia é gerada a partir de fontes renováveis e cabe à CleanClic organizar demanda e consumo a partir dos perfis de consumo dentro de cada área de concessão.

A iniciativa foi desenvolvida dentro do Sicoob-ES e é uma das startups da Ciclos, cooperativa criada para acelerar negócios de impacto que possam agregar valor ao Sicoob.

“Tanto a CleanClic quanto a Ciclos têm como propósito democratizar o acesso a bens e o aproveitamento de capacidades ociosas de ativos passíveis de serem compartilhados”, pontua Romero.

Dessa maneira, o “modelo de negócios busca ressignificar conceitos de inovação e eficiência para benefício de todos, passando por conceitos muito debatidos por Trebor Scholz como propriedade coletiva, transparência e portabilidade de dados e estrutura jurídica protetora”, explica.

O case da CleanClic foi contado em detalhes no Cooptech 2019, o principal evento brasileiro sobre inovação no cooperativismo.

No mesmo evento foi apresentado o case da Cargon, startup criada pela Coopercarga com a proposta de ser um operador logístico virtual. A intenção, conta seu Founder e CEO, Denny Mews, é expandir as operações para uma plataforma digital.

“A relação da Cargon com as cooperativas é que ele nasceu dentro da cooperativa, iniciando a transformação digital e seguindo como um novo modelo de negócios”, explica Mews.

Perguntado sobre a possibilidade de a iniciativa se tornar uma cooperativa de plataforma, Mews conta que “A Cargon tem por premissa ser uma plataforma cooperativa para criar sinergia entre empresas, gerando movimento econômico entre os participantes.”

Assim, a intenção é dar oportunidade a todos que fazem parte da logística ampliarem negócios e proporcionar melhor gestão à indústria que contrata logística. “Um modelo estatutário cooperativo não deve se diferenciar de uma plataforma cooperativa”, diz.

Ou seja, ele espera que a plataforma “dê escala ao modelo de negócios e que a flexibilidade leve a novos modelos conforme a demanda, gerando o mesmo movimento econômico ou até maior que o convencional modelo cooperativo.”

Cooperativismo de plataforma no Cooptech 2019

Além dos cases citados acima, duas outras palestras sobre cooperativas de plataforma foram realizadas durante o Cooptech 2019. Uma delas de Rafael Zanatta. Advogado especialista em tecnologia e mestre pela USP, Zanatta é o tradutor do livro Cooperativismo De Plataforma, de Trebor Scholz.

No Cooptech 2019, ele abordou os segredos dessa modalidade e também os respectivos os entraves jurídicos existentes no Brasil para seu desenvolvimento. Gustavo Mendes, Cofundador do Coonecta, também falou sobre cooperativismo de plataforma.

Mendes havia acabado de regressar da Missão NY 19′ realizada pelo Coonecta e da Conferência Internacional de Cooperativismo de Plataforma. O tema da Conferência para a edição 2019 foi: “Who Owns The World? The State of Platform Cooperativism”. Assim, eles trouxeram insights da primeira missão brasileira de imersão em cooperativas de plataforma.

[activecampaign form=38]

spot_img
spot_img

Relacionados

Para ampliar conexões, RadarCoop lança comunidade online; acesse

O RadarCoop é o primeiro mapeamento do ecossistema brasileiro...

Cooperativas de reciclagem apostam na inovação para crescer

Práticas sustentáveis não são mais diferenciais: agora, a preocupação...
Bruno Loturco
Bruno Loturco
Jornalista especializado em comunicação e criação de conteúdo para as mais diversas mídias on e offline, com experiência em publicações técnicas e de negócios. Cada vez mais interessado e motivado pelo universo do cooperativismo, em busca de criar valor por meio da geração de conteúdo e conhecimento para a transformação digital deste tão importante segmento da economia.