Cooperativas de créditos de carbono: um novo mercado sustentável

As cooperativas cumprem um papel importante na agenda de sustentabilidade ambiental, uma vez que as mudanças climáticas afetam o bem-estar das comunidades. O mercado de créditos de carbono aparece, então, como uma maneira de aumentar a receita e, ao mesmo tempo, incentivar a redução das emissões.

Na COP27, realizada em 2022, o tema ganhou força diante de um cenário em que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a maior parte dos países está atrasada em relação a seus compromissos de reduzir emissões de carbono (CO²). Assim, o potencial desse mercado é crescente.

Segundo a ICC Brasil, representação nacional da International Chamber of Commerce, estima-se que o mercado de carbono brasileiro pode gerar receitas de até US$ 100 bilhões até 2030. A criação da primeira cooperativa de crédito de carbono do Brasil, em Alagoas, é um exemplo de que há oportunidades neste mercado. 

“O Brasil tem um potencial incrível e, particularmente, as cooperativas têm como ajudar os produtores a acelerarem a transição para uma agricultura de baixo carbono”, apontou o CEO da My Carbon, Eduardo Bastos, durante a 2ª Jornada RTC, em Gramado (RS).

Vale lembrar que os créditos de carbono têm total relação com as práticas de ESG. Através das iniciativas voltadas ao mercado de carbono, as cooperativas exercem a responsabilidade ambiental, além de gerarem impacto social e econômico.

Entenda, a seguir, o que é o mercado de créditos de carbono e conheça cooperativas que tomaram a frente de projetos voltados à comercialização de créditos de CO². Boa leitura!

Como os créditos de carbono funcionam

A busca por créditos de carbono surgiu a partir do Protocolo de Kyoto, na reunião da Cúpula do Clima e do Aquecimento Global (COP3), realizada em Kyoto, em 1997. Durante o encontro, os países presentes estabeleceram compromissos com a redução da emissão de gases do efeito estufa (GEE), associados aos problemas ambientais e climáticos.

Nesse contexto, os signatários do Protocolo de Kyoto criaram o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), a fim de validar e certificar as ações adotadas por países na redução de emissão de gases de carbono. 

Pelo Protocolo, ficou definido que, para cada tonelada de carbono não emitido, o MDL gera um crédito que pode ser comercializado com outros países que ainda buscam atingir a meta de redução de emissão de CO². 

Mercado regulado e mercado voluntário

O mercado de carbono regulado é oriundo do Protocolo de Kyoto. Nele, a comercialização de crédito de carbono ocorre entre países, regulada pela ONU, com fim de atingir as metas de redução de emissão de CO².

Paralelamente ao mercado regulado, existe o mercado voluntário. São iniciativas de cidadãos, empresas, ONGs, cooperativas, entre outras instituições, para a redução de emissão de carbono. Essas iniciativas não estão atreladas às metas de Kyoto, mas são auditadas por entidades independentes e também podem comercializar créditos. 

Por exemplo: uma cooperativa decide reduzir a produção de CO² através de ações ambientais de preservação de floresta ou replantio de árvores, gerando créditos a serem vendidos a cada tonelada de carbono reduzida, assim como é feito entre países.

No Brasil, ainda não há uma regulação desse chamado mercado voluntário. Atualmente, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei PL 528/2021, que estabelece o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE). A proposta é regulamentar a compra e venda de créditos de carbono no mercado voluntário brasileiro.

Segundo a ICC Brasil, na próxima década, o Brasil tem potencial para suprir de 5% a 37,5% da demanda global do mercado voluntário, e de 2% a 22% da demanda global do mercado regulado pela ONU. 

Etapas para implementar um projeto de créditos de carbono

O Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta quatro etapas para iniciativas de projetos no mercado voluntário de carbono:

  1. Elaboração do projeto: primeiro é preciso identificar o potencial gerador de créditos carbono da atividade redutora de emissões de CO² e definir a metodologia para a sua quantificação.
  2. Validação do projeto: o projeto necessita, ainda, ser validado por auditorias independentes e credenciadas pelos padrões de certificação de crédito de carbono.
  3. Registro: após a validação, é feito o pedido de registro nos mesmos padrões de certificação. Uma vez registrado, é possível entrar em operação e emitir créditos de carbono no mercado voluntário.
  4. Monitoramento e certificação: durante a operação é feito o monitoramento da redução de emissões, a fim de contabilizar o CO² foi reduzido. Esse processo também deve ser verificado e validado por auditoria independente para garantir a integridade dos dados e obter a certificação dos créditos gerados.

Como as cooperativas atuam no mercado de créditos de carbono

Para entender melhor o mercado de créditos de carbono, listamos três iniciativas de diferentes países. Confira a seguir.

Associação de Produtores de Crédito de Carbono Social do Bioma Caatinga

Pioneira no Brasil, a Associação de Produtores de Crédito de Carbono Social do Bioma Caatinga atua na região do cânion do rio São Francisco, em Alagoas. Através da preservação do bioma da Caatinga e da venda de crédito de carbono, a associação proporciona proteção ambiental e geração de renda para os pequenos produtores.

Juntas, as áreas preservadas dos associados abrangem partes dos estados de Alagoas, Bahia, Pernambuco e Sergipe. O objetivo da associação é realizar um estudo sobre o estoque de carbono dessas áreas, além da regeneração das áreas desmatadas.

Segundo Haroldo Almeida, consultor ambiental da associação, explorar o créditos de carbono é “uma forma, primeiro, de garantir a vegetação em pé e de compensar o impacto ambiental que está acontecendo. Por exemplo, eu tenho minha área preservada, gero meus créditos de carbono, preservo e, assim, posso colocar esse crédito de carbono para a venda”, disse em entrevista ao portal Brasil De Fato.

A intenção da associação é também estabelecer diferentes eixos de economia regenerativa na região, como uma rede cooperativa de produção de energia solar, ecoturismo, escolas de sustentabilidade e sistemas integrados de reciclagem.

Cooperación Verde: intercooperação colombiana enfrenta mudanças climáticas

Em 2009, a união de 52 cooperativas colombianas fez nascer o Projeto Cooperación Verde.  Comprometido com a sustentabilidade ambiental, o programa de intercooperação atua com reflorestamento, comercialização de crédito de carbono e recuperação de solos.

Através do reflorestamento de regiões atingidas por conflitos armados, por exemplo, o projeto promove a compensação das emissões de carbono e, consequentemente, gera trabalho e renda para as populações locais.

Ao todo, são cerca de 280 mil toneladas de CO² já capturados, o que gerou uma receita de US$ 2,4 milhões em créditos de carbono. 

Além disso, estima-se cerca de 2 milhões de árvores plantadas, 1.800 hectares de solos recuperados e cerca de 100 mil postos de trabalho direta ou indiretamente relacionados ao projeto.

Em pouco tempo o programa pode, ainda, ampliar sua atuação e passou a produzir alimentos orgânicos e comercializar carvão e madeira certificados.

Land O’ Lakes: cooperativa agro dos EUA lança programa de créditos de carbono

Nos Estados Unidos, a cooperativa agrícola Land O’Lakes lançou, em 2021, um programa de geração e comercialização de créditos de carbono voltado para atender a crescente demanda por créditos de emissão de gases do efeito estufa (GEE).

Através da Truterra LLC, uma subsidiária da Land O’Lakes, criou-se o programa TruCarbon, em parceria com a Soil Health Institute, instituição voltada para a recuperação de solos. O projeto teve como resultado 100 mil toneladas métricas de créditos de carbono vendidas para a Microsoft Corp.

Além disso, segundo Beth Ford, CEO da Land O’Lakes, através do estudo e da disponibilização dos dados do programa de carbono, os usuários poderão avaliar como as práticas ecológicas podem afetar os resultados financeiros das fazendas.

Segundo estimativa da Land O’Lakes, os agricultores da cooperativa receberão até US$ 20 por tonelada de carbono na primeira parcela de créditos. Ademais, é possível acessar os dados históricos com o fim de obter créditos adicionais para até cinco anos anteriores ao cultivo.

O papel do cooperativismo para a sustentabilidade ambiental

As práticas de sustentabilidade ambiental tornam-se mais urgentes a cada ano. A ONU prevê que, até 2030, a emissão de gases do efeito estufa deve crescer 10,6%, e que 43% das emissões precisam ser reduzidas. Por isso, é crescente a procura por créditos de carbono.

Nesse contexto, tendo por princípios a intercooperação e o interesse pela comunidade, as cooperativas possuem potencial de desempenhar o protagonismo no mercado de créditos de carbono. Cabe ao cooperativismo exercer seu papel ambiental e social tão essenciais, impactando o bem-estar da sociedade e, ao mesmo tempo, gerando empregos e renda.

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Felipe Nascimento
Felipe Nascimento
Jornalista com especialização em Design Editorial. Atua na área de comunicação pública e projetos gráficos editoriais. Gosta de jazz e fotografia de rua. Atualmente é redator freelancer na Coonecta.