As plataformas de negócios fundadas como startups contam com um ecossistema de apoio cada vez mais abrangente. Além de terem a possibilidade de participar de programas de aceleração e mentoria, as startups em geral têm acesso potencial a investimentos de natureza variada. Seus idealizadores sabem que eventualmente poderão ter a oportunidade de apresentar seus planos para investidores anjos e receber aportes fundamentais para desenvolver seu negócio.
A percepção de que cooperativas de plataforma precisavam contar com um ambiente parecido, em que seus criadores tivessem a chance de mostrar seus planos para outros agentes do setor, trocar ideias e receber orientação de membros sêniores do mercado, levou a Co-operatives UK, uma rede de milhares de cooperativas britânicas, a desenvolver a Unfound Accelerator em 2017.
“A Unfound foi criada como parte de uma estratégia de enfoque na transformação digital do setor de cooperativas. Por isso começamos com o cooperativismo de plataforma”, conta Ludovica Rogers, membro da equipe de desenvolvimento da Co-operatives UK que lidera o programa Unfound.
O que são as plataformas cooperativas
Conforme conceitua a Co-operatives UK, uma cooperativa de plataforma é uma “plataforma digital projetada para fornecer um serviço ou vender um produto” que não é propriedade de um único dono ou de um grupo de investidores, mas de um coletivo, além de ser administrada pelas pessoas que dependem ou participam dela.
“Elas oferecem uma alternativa positiva ao capitalismo de plataforma – cujos expoentes incluem Facebook, Google, Uber, Airbnb –, que tem sido criticado por suas práticas exploratórias e baseadas na extração [dos ganhos dos trabalhadores a ele vinculados]”, define a organização.
Dessa maneira, as cooperativas de plataforma têm surgido para propor caminhos opostos aos das startups mercantis, sobretudo no que se refere aos seus aspectos organizacionais e aos seus impactos na sociedade.
Muitas cooperativas de plataforma, por exemplo, evitam usar ferramentas tecnológicas que se notabilizaram no setor de Big Tech, como análise de dados e inteligência artificial para incorporar e usar as informações dos usuários com finalidades de monetização.
Com acesso muito reduzido a investimentos e recusando-se a seguir o mesmo modelo de negócios das startups digitais, as cooperativas de plataforma enfrentam desafios importantes para crescer. A aceleradora Unfound foi criada para estimular o desenvolvimento delas sem desconsiderar suas especificidades.
Startups tradicionais x Cooperativas de plataforma
Conforme Rogers explica, as diferenças conceituais e práticas entre uma startup digital e uma cooperativa de plataforma são profundas.
“As formas de trabalho e a estrutura legal são muito diversas. Mas uma das principais diferenças é o business plan. Startups e cooperativas têm planos de negócio muito diferentes”, ela aponta.
Enquanto as startups em geral visam a um crescimento abrupto e exponencial de suas operações e lucros de modo a gerar dividendos para os investidores, as cooperativas buscam consolidar sua estrutura para continuar atendendo as necessidades de sua comunidade de profissionais e usuários.
Conheça a Unfound
Por se tratar de uma iniciativa da Co-operatives UK, a Unfound oferece aos participantes do seu programa de aceleração a possibilidade de acessarem outros programas de suporte a cooperativas, incluindo consultas com a equipe de aconselhamento da organização.
A Unfound é mantida pelo Co-operative Bank, o que possibilita que as cooperativas aceleradas possam concorrer a uma verba de auxílio ao desenvolvimento de negócios. O programa também foi idealizado pela organização Stir to Action e recebeu apoio da Open Society Foundation e da Nesta.
A ideia dos criadores da Unfound é transformar ideias pioneiras em soluções concretas de negócio. Podem concorrer a uma vaga no programa de aceleração grupos de ao menos duas pessoas que tenham uma ideia clara e convincente para estabelecer uma cooperativa plataforma e que precisem de auxílio para começar seu negócio.
Os critérios para participar da aceleração
Entre os requisitos, os potenciais participantes devem estar prontos para viabilizar um negócio e devem acreditar no cooperativismo de plataforma como o modelo ideal para ele.
“A fase em que as pessoas nos procuram tem mudado um pouco. Inicialmente, nos procuravam com uma ideia. Agora, muitos já têm uma plataforma ou um negócio, mas querem transformá-lo em uma cooperativa”, descreve Rogers.
Os candidatos se inscrevem no ciclo anual de aceleração, fornecendo informações sobre si e seus negócios. Uma entrevista on-line faz parte do processo de seleção. Ao menos um membro do time deve residir no Reino Unido, onde necessariamente a cooperativa deverá ser registrada.
As equipes selecionadas participam de um programa estruturado em quatro eixos: estruturas de cooperativas e modos de trabalho; desenvolvimento de produto; planejamento e estratégia de negócios; marcas e marketing.
A ideia é que os participantes saiam do processo municiados de informações sobre como registrar uma cooperativa; com um plano de negócios e uma estratégia de financiamento definida; com um plano de marketing para dar os primeiros passos na jornada de captação de recursos; e com um protótipo validado e um plano de ação para desenvolver sua plataforma.
Masterclasses e encontros com especialistas
São cerca de dois meses de atividades, com 10 masterclasses semanais e atividades de grupo para serem executadas entre os encontros. Há ainda a possibilidade de realizar até nove horas de encontros com três especialistas em tópicos específicos relacionados aos desafios de cada time ou com fundadores de cooperativas de plataforma.
Membros de diferentes grupos podem se reunir a cada 15 dias para trocar ideias e discutir caminhos. A cada 15 dias, também acontece uma conversa com a líder da Unfound sobre os desafios de cada equipe.
Os participantes que completam o ciclo de aulas têm a oportunidade de apresentar seu plano de negócios em um evento público online com potenciais investidores, representantes de cooperativas de destaque e especialistas no ramo.
No encontro, as equipes podem solicitar o tipo de apoio de que precisam – e os investidores terão a liberdade de fazer aportes ou contribuir de outra maneira que acharem desejável.
O Co-operative Bank oferece £10,000 como prêmio para as equipes, com base no voto do público.
Os participantes que apresentam melhor desempenho ganham, além disso, o pacote de contato da Co-operatives UK, que inclui a possibilidade de fazer consultas com especialistas da organização por 10 vezes ao longo de um ano. Seu estudo de caso é publicado no site da Co-operatives UK e os canais de mídia da rede fornecem visibilidade adicional.
Ludovica Rogers conta que as seis equipes participantes no ano passado acabaram se registrando como cooperativas.
“Eu adoraria ver 10 novas cooperativas se formando neste ano – e um crescimento exponencial nos próximos anos”, afirma.
Unfound: além do programa de aceleração
A Unfound não se resume ao programa de aceleração. A iniciativa também inclui atividades de conscientização sobre cooperativismo de plataforma e articulação com outras organizações e entidades.
Rogers acredita que, embora ainda haja um nível baixo de consciência a respeito do cooperativismo de plataforma, ele tem crescido.
“As pessoas que mais demonstram interesse no assunto são os acadêmicos, pesquisadores, think thanks. Seu interesse é teórico. No lado prático, temos sentido falta de mais agentes”, lamenta. “Mas a pandemia nos mostrou a importância da colaboração e da esfera digital, o que deve levar mais gente a compreender melhor as cooperativas de plataforma”.
Entre os desafios que os fundadores de cooperativas de plataforma enfrentam, Rogers aponta como os principais a dificuldade de montar um time adequado – “às vezes você tem pessoas com boas ideias sobre negócios, mas pouco conhecimento de tecnologia, às vezes o contrário” – e a barreira para acessar investimentos.
“O principal problema ainda é o capital. No Reino Unido, as cooperativas de plataforma têm trabalhado com um tipo de investimento que requer muita paciência por parte do investidor”, ela explica.
“Em vez de ganhar uma parcela do negócio em capital, ele recebe juros – mas pode haver um acordo para que a cooperativa só pague os juros após certo tempo, dependendo de como andarem os negócios”, ela descreve.
Rogers afirma que algumas cooperativas foram lançadas com esse modelo de investimento, mas ainda não ganharam escala. “Ainda precisamos saber se esse modelo de investimento será capaz de apoiá-las durante o crescimento, ou se precisaremos identificar outros modelos”, conclui.
Agora que você já conhece a Unfound, conheça também a Start.Coop, uma aceleradora de cooperativas com atuação nos EUA e Canadá.